sexta-feira, 11 de maio de 2012

CARTA DE BELÉM - REDE GTA

Belém, 30 de maio de 2008
Reunidos em Belém nos dias 29 e 30 de maio na VII Assembléia Geral da Rede GTA, lideranças socioambietais dos 09 estados da Amazônia Legal
A construção de grandes obras de infraestrutura e a perspectiva de expansão do agronegócio na região, aliada a ausência de ordenamento e regularização fundiária, vem fomentando processos de grilagem de terras públicas e desmatamento, situação que em geral se traduz em violência e desmando contra os povos e populações tradicionais, como no emblemático caso do assassinato da companheira Irmã Dorothy – uma verdadeira vergonha nacional que culminou com a ausência de condenação dos mandantes deste crime bárbaro – e do recente desaparecimento do companheiro João Batista no Estado do Amazonas.
Avaliamos que o PAC na Amazônia é um conjunto de obras de infraestrutura que não atendem aos anseios dos amazônidas. E por isso, nos colocamos contra a construção de obras como a hidrelétrica de Belo Monte no Pará, de Santo Antônio no Amapá, Jirau e Santo Antônio no rio Madeira em Rondônia, Estreito no Tocantins e Marabá no Pará. É com pesar que constatamos que o PAS – Plano Amazônia Sustentável – ficou reduzido a ações de minimização de impactos das grandes obras de infraestrutura previstas no PAC, frustrando, dessa forma, aqueles que acreditavam que o PAS se constituiria em um novo paradigma de intervenção do Estado na Amazônia como agente indutor de desenvolvimento local sustentável.
O desenvolvimento que queremos para a Amazônia passa necessariamente pelo resgate da cidadania dos povos e populações tradicionais, pela garantia dos direitos de saúde, educação, comunicação e produção sustentável adequados às peculiaridades dessas populações e também das mulheres, jovens e negros. Um grande passo já foi dado com o lançamento da Política de Povos e Comunidades Tradicionais pelo Governo Federal em 2007, mas ainda se fazem necessários avanços práticos que venham materializar a política em ações e investimentos concretos.
É necessário simplificar os procedimentos para regularização fundiária de terras ocupadas por agricultores familiares e comunidades, bem como simplificar os procedimentos para aprovação dos Planos de Manejo Florestal Familiar e Comunitário. Dessa forma é possível garantir melhoria da qualidade de vida das famílias por meio do seu trabalho como manejadores da floresta, tanto como protetores do nosso patrimônio, e para que isso possa acontecer, as OEMAS devem ser fortalecidas técnica e institucionalmente, bem como o Ibama e Instituto Chico Mendes devem estar preparados para lidar com a demanda de licenciamentos para Planos de Manejo Florestal Familiar e Comunitário, criação dos planos de manejo das UCs, e a constituição dos conselhos deliberativos.
Atualmente as licenças para empreendimentos dessa natureza levam de 1 ano e meio a 2 anos para serem aprovados, contando com assessoria especializada para que isso aconteça. A maioria das comunidades nunca vê sua demanda de licenciamento ser atendidas. Da mesma forma, cobramos maior eficiência ao Programa Proambiente e que sejam encontradas soluções para viabilizar o pagamento dos serviços ambientais aos pequenos produtores rurais que adotam práticas de sustentabilidade ambiental em sua produção.
Na área da saúde avaliamos que a prevenção é a política que melhor atende as demandas das comunidades e populações tradicionais. A prevenção envolve a valorização dos saberes e conhecimentos tradicionais, investimento em pesquisa voltado para a promoção da fitoterapia popular, visando à efetivação de Farmácias da Floresta, e que o programa Médico da Família possa ser ampliado para atender a demanda das populações da floresta.
Na educação é fundamental que os conteúdos da educação escolar sejam adaptados à realidade do lugar e da cultura, valorizando a história dos povos das florestas, bem como as escolas familiares rurais e as casas familiares agrícolas, agroextrativistas e das florestas e que as mesmas sejam incluídas no sistema educacional do pais.
O isolamento é um dos principais empecilhos para promoção da cidadania de povos e populações tradicionais. Cobramos a ampliação de Pontos de Cultura e de programa de inclusão digital, por meio da multiplicação das antenas do GESAC para as comunidades da floresta. Cobramos também que sejam definidos critérios populares de controle social para a criação e o funcionamento de rádios que sejam efetivamente comunitárias, que grande falta fazem para as comunidades, devida a atual legislação excludente e que privilegia especialmente os interesses de políticos e não os da população quando da outorga de funcionamento de rádios.
A luta das mulheres e dos negros também são prioridades dos movimentos sociais da Amazônia. Ainda convivemos na Amazônia com a exploração do trabalho precário e do análogo escravo, e a prostituição infantil em níveis alarmantes; ainda temos que conviver com a falta de regularização fundiária de comunidades quilombolas, e mesmo as políticas públicas voltadas para a promoção do trabalho das mulheres como o PRONAF MULHER é de difícil acesso e pouca divulgação.
Queremos apoio para multiplicar as experiências emancipatórias das mulheres empreendedoras da Amazônia, das mulheres quebradeiras de coco, ribeirinhas e quilombolas que estão construindo um futuro melhor para si e para seus filhos.
Finalmente, para que a cidadania possa ser construída é necessário garantir o direito mais importante que é o acesso a terra e aos recursos naturais. Queremos a imediata criação das Reservas Extrativistas Rio Branco – Jauperi em Roraima, da Reserva Extrativista Renascer no Pará, da Reserva Extrativista Taim no Maranhão e das Reservas Extrativistas do Rio do Rola e do Croa no Acre. Todos os processos de criação dessas reservas extrativistas estão na Casa Civil da Presidência da República aguardando para serem criadas.
Reiteramos nosso total apoio ao processo de homologação da TI Raposa Serra do Sol e a disseminação da Lei do Babaçu Livre nos municípios de incidência de babaçuais e presença das mulheres quebradeiras de coco. Por fim reiteramos nosso compromisso com o desenvolvimento sustentável e responsável, com a floresta e com a promoção social e econômica dos povos que nela habitam.

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